Bom Dia!
Na postagem de hoje, registro um pouco da conversa que tive com os dois alunos de graduação e as duas mestrandas/estagiárias que estiveram presentes na aula de Prática Integrada IV, do curso de licenciatura em Filosofia, no dia de ontem, 19 de dezembro de 2013.
Começamos pela abordagem dos objetivos da disciplina. Os quais concernem ao desenvolvimento de habilidades da prática docente, sobretudo, a que diz respeito ao ensino de filosofia para estudantes do ensino médio, onde recentemente essa disciplina tornou-se obrigatória.
Ao longo da conversa, tivemos a impressão de que há pouco interesse dos estudantes de filosofia pelo .exercício da profissão de Professor. Essa sensação se reforça pelo constatação de que cada vez mais diminui o número de estudantes concluíntes do curso e da baixa frequência deles nas aulas.
Não sou indiferente às críticas que certamente farão a esse argumento, pelas quais se retorquirá que esses fenômenos devem-se, em grande parte, à falta de habilidade do professor da disciplina para reter o interesse e atenção dos estudantes.
Gostaria muito de poder responder a uma tal objeção, desde que me dessem a oportunidade de faze-lo, comparecendo às aulas e expressando clara e objetivamente as inconsistências de meu desempenho.
Enquanto isso não for feito, levanto a hipótese de que existem outros fatores mais graves que contribuem para a manutenção dessa inércia. E os que mais me parecem tangíveis são a desvalorização social e econômica desse ofício, a pressão para desqualificar o ensino público, laico e humanista e para substitui-lo por um ensino técnico, profissionalizante orientado por valores religiosos ou ideológicos.
Outro fator que me parece relevante é certo preconceito contra a ideia de que aquele que se ocupa da filosofia, no Brasil, não é um profissional, nem um técnico, mas um livre pensador. Trata-se de um preconceito muito prejudicial à consolidação de um curso de formação de professores dessa disciplina. Nele estão embutidos alguns mitos. Em primeiro lugar, o mito de que o exercício da filosofia requer somente a decisão de pensar. De fato, este é um requisito sem o qual não se poderá fazer a experiência da reflexão filosófica. Mas a o exercício sistemática da dúvida, a elaboração de conceitos, a análise crítica, a interpretação de textos, a análise de discursos bem como a especulação acerca das relações entre o real e o racional exigem a aquisição de competências mediante exercícios escolares, comparecimentos às aulas, participação na elaboração de monografias, coletas de dados, pesquisa bibliográfica. Exigem também a disciplina espiritual necessária para afastar-se de preconceitos e para enfrentar a contemplação da verdade, pois essa se trata de uma das tarefas mais desafiadoras de quem se propõe a examinar a fundamentação das certezas, no campo da ciência, no da ética, no da religião, no da arte, na política etc.
Outro preconceito é o de que cabe ao professor de filosofia tão somente transmitir aos seus alunos o conteúdo previsto nas diretrizes curriculares. No mesmo sentido, isso é indispensável. Mas, devemos lembrar que nenhuma estudante se interessará pela filosofia tão somente por ser obrigado a estudar para se preparar para fazer provas e trabalhos a fim de obter as notas requeridas para ser aprovado na disciplina. Ao lado do conteúdo, que constitui um legado inestimável da cultura universal, a razão de ser da presença dessa disciplina nos currículos do ensino médio é favorecer o cultivo e o desenvolvimento da capacidade crítica, do discernimento e do gosto pelo uso da palavra nas diversas esferas da vida pública e da cultura entre os estudantes. O desenvolvimento dessas competências exigem, de fato, a franqueza, isto é, a instalação de estudantes e professores em uma ambiente de livre pensar, da relações entre adultos, como também de amizade e afeto. Mas, além disso, elas requerem a apropriação de técnicas, como o do manejo da palavra falada e escrita, o da dúvida sistemática, o da análise genética, o da análise estrutural, o da analogia, o da exposição, o da argumentação e o de outras que envolvem o uso de novas tecnologias do ensino e da comunicação. Nesse tópico, não podemos esquecer do essencial, que é a associação do estudo da filosofia às inquietações pessoais os estudantes, sua curiosidade e sua irreverência em relação aos padrões estabelecidos da cultura. Alguém já disse que ninguém ensina ninguém, pois a aprendizagem se dá por um esforço e um decisão de cada um. Contudo, me parece também que os autodidatas representação uma parcela excepcional no conjunto dos profissionais que tiveram êxito em suas carreiras e que, em sua maioria, tais mestres somente puderam se destacar mediante o exercício do diálogo, ou seja, na prática da sociabilidade e na construção de relações de amizade.
Por fim, o livre pensador constitui um ideal, na direção de quem caminhamos tão somente com ajuda de uma prática pedagógica, isto é, uma prática mediada pelas ferramentas facilitadoras da aprendizagem, aquelas cuja aquisição exigem a execução de atividades disciplinares e técnicas.
Gostaria de associar essa discussão ao ensino público, pois a difamação do Estado como agende eficaz na disseminação da cultura constitui uma ação política sem descontinuidade e que tem contribuído muito para a desqualificação das universidades e das escolas públicas.
Mas essa conversa não para aqui.
Vamos continuá-la nos próximos dias.
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